Ser demoníaco nunca foi tão divertido.
Como é bom ser pego de surpresa por algum evento agradável. Faz com que você se sinta bem mesmo sem estar no controle da situação ou mesmo saber o que lhe aguardava. De certo modo, pode-se dizer que foi o que aconteceu comigo ao fazer a análise de Bayonetta. Embora houvesse certa expectativa aqui no escritório com relação ao título e várias pessoas soubessem que poderia ser de qualidade, eu estava cético.
Anteriormente, eu pensava que se tratava apenas de mais um “hack n’ slash” com uma protagonista seminua para ter apelo junto ao público jovem. E eu estava certo, embora não tivesse ideia de quão divertido isto iria se revelar. Bayonetta é muito mais do que apenas roupas reveladoras e insinuações sexuais descaradas. Ela não seria Bayonetta sem elas, mas não seria mais do que simplesmente Bayonetta sem o resto do jogo. E o é.
Nada do que eu tivesse lido poderia ter me preparado para a radical mudança de conceitos que aconteceu conforme eu fui jogando. No início, me parecia que minhas suspeitas estavam certas e que o game seria razoável — afinal de contas, é muito difícil entender a história, inicialmente, sem qualquer tipo de informação prévia a respeito (e eu não havia lido nada sobre a trama).
Mas já de início pude ver que a produção era algo mais grandioso do que eu esperava, sendo que a qualidade do trabalho ficava óbvia já nas primeiras cutscenes e animações. Embora sejam em um estilo inusitado — várias passagens são contadas através de slides e não de animações propriamente ditas — você é gradualmente cativado pela ambientação.
Aqui vale uma pequena introdução ao mundo de Bayonetta. Se trata de algo bastante semelhante ao nosso dos dias atuais, mas o passado medieval é um tanto quanto diferente — algo que possui consequências até a idade contemporânea. Isto porque dois grupos, um de bruxas e um de sábios (um de mulheres e um de homens, basicamente) possuíam poderes sobre-humanos e lidavam com várias realidades.
Estas realidades são compostas por Paradiso, Inferno e o mundo em que vivem os humanos — além do Purgatorio no meio dos três. Bayonetta é uma bruxa inserida neste cenário, embora não tenha memória alguma de sua vida passada, tendo acordado há vinte anos em um caixão dentro de um lago e tentado desde então descobrir a verdade sobre sua história.
Assim, a trama leva o jogador à Europa, mais precisamente à cidade fictícia de Vigrid. É na região em torno dela, e nas realidades alternativas, que ocorre a maior parte dos acontecimentos do título. É impossível não ver as influências de Devil May Cry ao longo do game, algo natural se considerarmos que foi dirigido pela mesma pessoa que guiou Dante ao sucesso.
Aprovado
Do que nós gostamos
Ambientação
O mundo de Bayonetta é absolutamente incrível. O cenário é algo que tira o fôlego a cada vez que se modifica, pela excelente temática que é inserida em cada um deles. Quando se trata de retratar uma estação ferroviária européia antiga, a sensação que é passada ao jogador é exatamente a de estar em um lugar como esse. Quando é preciso transmitir a sensação de calma geralmente associada ao Paraíso, folhas e animais voando em planícies douradas e verdejantes dão conta do recado.
Mas quando é preciso mostrar a brutalidade demoníaca de lugares infernais, a coisa muda radicalmente e coloca o jogador em meio à destruição e ao caos. Este contraste é algo excelente e serve para não deixar que o jogo se torne monótono nunca, em termos visuais. Sempre existe algo de novo a ser notado e você está sempre lutando em locais fantásticos.
Em um título que aposta tanto em sua protagonista, é extremamente satisfatório ver que tanta atenção foi dada aos cenários, de forma a criar uma experiência realmente completa e coerente, fazendo com que seja quase possível de acreditar que locais como este existam e que uma bruxa com óculos esteja por aí caçando seu passado.
Caracterização
Nenhum game consegue fazer o jogador conectar-se aos personagens se estes não forem suficientemente elaborados. E, embora este título foque em um só (preciso dizer quem?), todos os que aparecem na tela servem um propósito, e o fato de serem bastante caricaturais apenas os torna mais carismáticos — ou engraçados, dependendo de sua função! Embora as vozes possam destoar, de vez em quando, do que está sendo mostrado na tela, no geral elas estão muito precisas.
Bayonetta em si é extremamente envolvente como protagonista. Seus gestos e olhares falam mais do que as palavras que saem de sua boca — que estão forradas, na maior parte das vezes, de insinuações, ironias e sarcasmos. O jeito sexy e perigoso que ela cria e mistura também serve para torná-la ainda mais provocativa, algo que é justificado pelas suas ações.
Um ponto especial que deve ser ressaltado é a atitude dela. As batalhas mais parecem coreografias de dança do que porradaria descabida. Tudo é feito com classe e estilo, sem que Bayonetta perca jamais a pose. Enquanto seus inimigos estão frequentemente forrados de sangue e machucados, Bayonetta simplesmente solta borboletas quando atingida e sua roupa (que é formada por seu cabelo) nunca está sequer suja. É impossível não ser seduzido pela bruxa.
Jogabilidade
O ponto alto do game, sem dúvida alguma. A jogabilidade de Bayonetta é algo simplesmente excelente. Sempre fluida, ela faz o jogo ser o que é, pois permite que haja ação ininterrupta — ou, nas palavras dos desenvolvedores, clímax infinito. Isto porque é possível encaixar combos uns atrás dos outros, envolvendo tiros, chutes e golpes com as mais variadas armas, e principalmente movimentação. É preciso desviar de ataques o tempo todo, tanto através de esquiva quanto de pulos ou corridas.
O fato de poder transformar-se em animais durante as batalhas também é algo extremamente empolgante. Caso esteja cercado de inimigos, não se preocupe: vire uma pantera e escape rapidamente para em seguida voltar com tudo, descendo o braço. Um golpe iminente está vindo e é inevitável levá-lo? Transforme-se em morcegos e ignore o dano causado.
Tudo é absolutamente fluido, o que faz com que a coisa toda seja tão empolgante. Quando você perde batalhas, tem a certeza de que a culpa é sua e não do jogo ou dos controles, e que basta aprender a forma certa de derrotar os oponentes para sair vitorioso de cada um dos combates.
Combates estes que possuem a dose certa de ação. Em alguns momentos você deve lidar com inúmeros inimigos, enquanto em outros um ser gigantesco deve ser demolido aos poucos para que você continue em sua missão de recuperar as memórias perdidas.
O cenário é um personagem
Isto poderia ter sido dito na ambientação, mas é algo que se mistura à jogabilidade também. Os mapas de cada uma das fases podem mudar a qualquer momento, tanto devido a sua destruição por diferentes elementos quanto pela ação de personagens. Junte isto à habilidade de Bayonetta de andar nas paredes em determinados momentos, e você tem um conjunto completo.
Isto significa que é preciso pretar atenção não somente aos inimigos ou aos botões que você está apertando, mas também ao que está acontecendo em torno de você como resultado da pancadaria grossa que geralmente está rolando na tela. Pequenos deslizes e esquecimentos podem resultar em uma morte certeira e inevitável.
Trilha sonora
Antes da parte boa, apenas um porém que nos desagradou: a mesma música é utilizada em todos os combates. Assim, é possível que você se canse dela. Fora isso, os sons são absolutamente encantadores. Eles se adaptam de forma excepcional aos cenários e à ação que está se desenrolando no momento, e ajuda certamente a criar uma experiência única.
Gradual
Conforme Bayonetta recupera uma memória, ganha uma nova habilidade. Conforme você progride no jogo, encontra novas mecânicas. Conforme sua performance melhora e você ganha mais dinheiro, pode comprar novos golpes, habilidades, armas e acessórios. Tudo é um processo, e embora vários jogos utilizem este sistema, apenas os melhores conseguem integrá-lo completamente à jogabilidade e à história de forma fluida.
Outro ponto positivo desta forma de levar a história é que sempre existe algo novo a ser realizado. Em uma das fases, por exemplo, Bayonetta sobe em uma moto e a dirige por uma ponte em colapso. Pequenas coisas que definitivamente não eram esperadas e apenas servem para complementar a experiência, dando um toque pessoal à coisa.
Sistema de pontuação
Um problema deste tipo de jogo é, geralmente, a falta de longevidade. Uma vez exauridas as possibilidades do game, as pessoas geralmente não pensam em jogá-lo muito mais. No entanto, este título busca eliminar o problema através de um sistema de pontuação elaborado — recompensando a habilidade e a performance do jogador de diversas maneiras.
Quanto melhor você for, mais pontos ganhará, sendo que eles se convertem em dinheiro dentro do game. Além disso, existe um sistema de medalhas para cada pedaço significativo da fase, de forma a verificar seu desempenho nos diferentes eventos — para que possa aprimorar-se no que realmente é necessário.
Além disso, existe um ranking online para comparar sua pontuação com a de outros jogadores — uma bênção para os jogadores competitivos, que não se contentam em derrotar o computador e querem mostrar a todos que são os melhores. Por fim, existe também, ao final de cada fase, um troféu. Infelizmente, como estávamos testando todos os aspectos do game e não indo atrás de uma performance impecável, tudo o que nossa equipe conseguiu foram troféus de pedra. Talvez você faça melhor!
Reprovado
O que nos espantou... No mau sentido
Japonês
Não, não estou sendo racista. Digo apenas que o game é tipicamente japonês, com efeitos absolutamente espalhafatosos, combos a torto e a direito e um sistema de pontuação elaborado, que recompensa aqueles que conseguem decorar as mais eficientes combinações e golpes. Embora isto seja fortemente mitigado pela temática de qualidade excepcional, ainda é possível ver claramente a influência oriental, algo de que nem todos gostam.
Sentimento de quero mais
O mundo de Bayonetta revelou-se tão cativante que é impossível não querer saber mais ou explorar outros locais vislumbrados apenas de relance durante as diferentes fases do jogo. Algo que não é possível, já que o caminho é absolutamente linear neste título. Não gostaríamos que fosse diferente, como sandbox ou algo assim, mas não pudemos deixar de sentir um pouco de frustração por não poder ver mais de algo tão bom. Quem sabe em Bayonetta 2...
Conclusão
Vale a pena?
Com absoluta certeza, sim. Bayonetta é um daqueles títulos que valem cada centavo da compra, e alugá-lo apenas fará com que você queira adquiri-lo. Jogabilidade praticamente perfeita, história envolvente e com uns poucos elementos históricos que a trazem para mais perto de nossa realidade, e um acabamento impressionante. Do que não gostar?
Basicamente, a única opção é não ser fã do gênero. Quem não gosta de games de ação e pancadaria, com um leve toque japonês, pode não se sentir tão à vontade — embora nem estas pessoas possam negar a qualidade do título. No entanto, para a maioria esmagadora dos jogadores de video games, Bayonetta é um game a ser conferido sem falta, pois excedeu, em muito, as expectativas. E certamente não pode ser tratado como uma cópia de God of War, Devil May Cry ou qualquer jogo do gênero, pois é um pacote fenomenal.